Introdução do Livro:
1 David Jacobus Bosch. Transforming Missions – Orbis books, 1991.
Neste livro desejo abordar o assunto do plantio de igrejas sob três
prismas: a teologia do plantio de igrejas, os princípios e estratégias do
plantio de igrejas em uma cosmovisão bíblica e, por fim, as possibilidades de
um movimento de plantio de igrejas.
Bosch1 entende que a Igreja no final do
primeiro século passou a ter uma clara compreensão da necessidade da ekklesia
– igreja local – para o enraizamento do evangelho nas cidades, províncias e
regiões mais distantes entre os gentios. Michael Green2 destaca que houve uma mudança de percepção quanto à
missão evangelística da Igreja nesse período, ao perceberem que Jerusalém
deveria ser o berço do evangelho e não o centro dele. Nascia o sentimento de
que a Igreja de Cristo deveria se espalhar pelo mundo através de igrejas
locais.
O apóstolo Paulo, mais do que qualquer outro, observou a necessidade de
não apenas evangelizar as áreas distantes, mas plantar ali igrejas locais que
vivam Cristo e falem do Seu Nome. Paulo usa as expressões plantar (1 Co 3.6- 9;
9.7, 10 e 11), lançar alicerces (Rm 15.20, 1 Co 3.10) e dar a luz (1 Co 4.15)
ao se referir ao plantio de igrejas. Bowers defende que Paulo, ao afirmar que
proclamou o evangelho de Cristo de forma completa (Rm 15.19) queria dizer que
igrejas haviam sido plantadas em toda aquela região. O’Brien, concordando com
Bowers, expressa que “proclamar o evangelho para Paulo não se resumia
simplesmente à pregação inicial ou à colheita de alguns frutos. Incluía toda
uma série de atividades ligadas ao amadurecimento e fortalecimento dos
convertidos com o intuito de estabelecê-los em novas igrejas locais”.
Apesar da missão da Igreja, sua Vox Clamantis, não ter sido a
ênfase da Reforma Protestante, certamente herdamos desse período a clara
preocupação com a Palavra e convicção de que somente através dela a Igreja de
Cristo se enraizará entre um povo ou em uma cidade. João Calvino enfatizava que
“... onde quer que vejamos a Palavra de Deus pregada e ouvida em toda a sua
pureza... não há dúvida de que existe ali uma Igreja de Deus3”.
O próprio termo para igreja no Novo Testamento - ekklesia - é
composto pela preposição ek (para fora de) e a raiz kaleo (chamar)
que, literalmente, poderia ser traduzido por “chamada para fora de”,
dando-nos a ideia de uma comunidade dinâmica, crescente, local, não enraizada
em si mesma ou com uma missão puramente interna. Obviamente, o termo também
está ligado à “agrupamento de indivíduos” e, de certa forma, à “instituição”,
porém adquire o conceito de “comunidade dos santos” e, fora Mateus 16.18
e 18.17, está ausente dos evangelhos aparecendo, contudo, 23 vezes em Atos e
mais de 100 vezes em todo o Novo Testamento.
Creio que não há forma mais duradoura de se estabelecer o evangelho em
um bairro, cidade, clã ou tribo do que plantando uma igreja local, bíblica,
viva, contextualizada e missionária.
De acordo com Van Rheenen, plantar igrejas é o ato de reproduzir
comunidades de adoração que refletem o Reino de Deus no mundo através da
proclamação do evangelho vivo. Donald MacGavran desenvolveu o estudo sobre
crescimento de igrejas e logo depois Garrison o apresentou em forma de
movimentos descritos como “um rápido e exponencial movimento de crescimento
de igrejas nativas, plantando igrejas dentro de um povo específico, área ou
segmento”.
Devido à diversidade de termos e definições há algumas limitações no
estudo do assunto.
Uma destas limitações é o estigma normalmente ligado ao conceito de
plantio de igrejas. É a abordagem pragmática. Como é um assunto
frequentemente associado à metodologia e processo de campo – dentro de um ponto
de vista pragmático – somos levados a entender e avaliar plantio de igrejas baseados
mais nos resultados do que em seus fundamentos teológicos. Consequentemente, o
que é bíblico e teologicamente evidente se torna menos importante do que aquilo
que é funcional e pragmaticamente efetivo4. Estou convencido que todas as decisões missiológicas devem estar
enraizadas em uma boa fundamentação bíblico-teológica, se desejamos ser
coerentes com a expressão do mandamento de Deus (At 2.42-47).
Uma segunda limitação ao estudar o assunto é aceitar o plantio de
igrejas como sendo nada mais do que uma cadeia de soluções para as necessidades
humanas. Chamarei de abordagem sociológica; essa deve ser nossa
crescente preocupação por vivermos em um contexto pós-cristão, pós-moderno e
hedônico. Isso ocorre quando plantadores de igrejas tomam decisões baseadas
puramente na avaliação e interpretação sociológica das necessidades humanas e
não nas instruções das Escrituras. Nesse caso, os assuntos culturais e
carências humanas, ao invés das Escrituras, determinam e flexibilizam a
teologia a ser aplicada a certo grupo ou segmento. Vicedon afirma que somente
um profundo conhecimento bíblico da natureza da Igreja (Ef 1.23) irá capacitar
plantadores de igrejas a terem atitudes enraizadas na Missio Dei e não
na demanda da sociedade5. A defesa
de um evangelho integral não deve ser confundida com o esquecimento dos
fundamentos da teologia bíblica.
Uma terceira
limitação é a abordagem eclesiológica, a qual está ligada à nossa
compreensão da própria natureza da Igreja. Apesar de concordar com Bosch que “não
é a Igreja de Deus que tem uma missão no mundo, mas sim o Deus da missão que
tem uma Igreja no mundo”, precisamos clarear o valor da Igreja em termos de
identidade. Quando Dietrich Bonhoeffer escreveu que “a Igreja é Igreja
apenas quando existe para outros”6 creio que ele está parcialmente certo. Apesar
de a Igreja possuir um papel prioritário em termos de atuação missionária, seu
valor intrínseco, extramissão proclamadora, precisa ser reconhecido porque é o
resultado do sacrifício de Jesus e Ele e a cruz são o centro do plano de Deus.
Assim, apesar da Missão ser uma constante prioridade bíblica na vida da Igreja,
não devemos definir essa Igreja apenas a partir da proclamação do evangelho sob
pena de nos tornarmos extremamente funcionalistas e utilitários. Adoração,
doutrina, fidelidade, santidade, unidade e comunhão são, também, importantes
aspectos que compõe a identidade da Igreja. Assim sendo, a Igreja não é um
mecanismo primariamente desenhado para evangelizar pessoas, mas um instrumento
para glorificar a Deus (Ef 3.10) e a proclamação – evangelização - é uma de
suas funções e resultado de sua existência. A ausência dessa compreensão mais
ampla tem gerado igrejas que, competentemente, espalham o evangelho mesmo não o
vivenciando em sua vida diária. Igrejas evidentemente missionárias, mas sem o
caráter de Jesus. Bíblicas apenas em uma fatia da vida cristã.
Essa compreensão eclesiológica, porém, não diminui a responsabilidade
da Igreja perante o mandamento missionário de Cristo. Não podemos subestimar
nossa vocação missionária de proclamar o evangelho a tempo e fora de tempo,
enquanto é dia. A proclamação, apesar de não ser a única característica
procurada por Deus em Sua Igreja, é possivelmente a propriedade mais urgente e
vital para o mundo em trevas. A ausência desse sentimento na vida diária da
Igreja é sintoma de enfermidade crônica, espiritual e bíblica.
Tendo dito isso, devemos compreender que Deus pode ser glorificado
tanto em uma cruzada evangelística com um milhão de pessoas em Acra quanto em
um culto doméstico em uma pequena igreja em Hayacucho (Rm 16.25-27).
A clara diferença entre a evangelização e o plantio de igrejas é o
propósito. No primeiro tencionamos apresentar Cristo a um indivíduo que poderá
guardar para si o evangelho ou anunciá-lo a outros. No segundo apresentaremos
Cristo a indivíduos em uma área definida de relacionamentos que se fortalecerão
em uma comunidade que será capaz de prover ensino da Palavra, ambiente para a
oração, comunhão e levá-los a apresentar Jesus a outros. Igrejas plantam
igrejas.
O apóstolo Paulo, além de todas as suas iniciativas evangelísticas
pessoais, jamais deixou dúvida que a estratégia para a evangelização de um
povo, cidade ou bairro, seria plenamente atingida apenas através do plantio de
igrejas locais bíblicas, vivas, autossustentáveis, autogovernáveis e
missionárias.
A igreja plantada mais rapidamente em todo o Novo Testamento foi
plantada por Paulo em Tessalônica. Ali o apóstolo pregava a Palavra aos sábados
nas sinagogas e durante a semana na praça; assim o fez durante três semanas e
nasceu, então, uma igreja local. Em 1 Ts 1.5, Paulo diz que o nosso
evangelho não chegou até vós tão somente em palavra (logia - palavra humana),
mas, sobretudo em poder (dinamis - poder de Deus), no Espírito Santo e em plena
convicção (pleroforia - convicção de que lidamos com a verdade).
Assim, percebemos que a igreja nascera em Tessalônica pelo poder de
Deus, pelo Espírito Santo e pela plena convicção. O poder de Deus manifesta o
próprio Deus e Sua vontade. Sem o poder de Deus não haveria transformação de
vida e sociedade. Sem o poder de Deus a Palavra não seria compreendida. Sem o
poder de Deus todo o esforço para plantar igrejas seria reduzido a formulações
estratégicas de ajuntamento e convencimento. O Espírito Santo é o segundo
elemento relatado por Paulo no plantar da igreja em Tessalônica. Sua função é
clara na conversão dos perdidos, em conduzir o homem à convicçãode que é
pecador e está perdido. Em despertar nesse homem a sede pelo evangelho e
atraí-lo a Jesus. Sem o Espírito podemos compreender que somos pecadores, mas
somente o Espírito nos dá convicção de que estamos perdidos e necessitamos de
Deus. Sem a ação do Espírito Santo a evangelização não passaria de proposta
humana, explicações espirituais, palavras lançadas ao vento, sem público, sem
conversões, sem atração a Cristo. A clara convicção é o terceiro elemento
citado por Paulo no plantar da igreja em Tessalônica. Trata da certeza de que
lidamos com a verdade. É a verdade de Deus. O plantio de igrejas é um processo
profundamente associado à verdade de Deus, à Sua Palavra. Não necessitamos - ou
podemos - utilizar expediente puramente humano para que igrejas sejam
plantadas. O marketing, as estratégias, os métodos de comunicação e
ajuntamento, a sociologia e antropologia são coadjuvantes no ato de plantar
igrejas. Devemos nos ater à Palavra - sua exposição. À Cristo - proclamá-lo. Ao
testemunho - evidenciar nossa experiência com Deus.
Paulo,
certamente, utilizou-se da logia, das palavras, no plantio da igreja em Tessalônica.
Ele nos ensina, porém, que não foi tão somente com palavras, mas com palavras
cheias do poder de Deus, usadas pelo Espírito Santo e convictas de que se lida
com a verdade do Senhor, que nasceu ali uma igreja local.
1 David Jacobus Bosch. Transforming Missions – Orbis books, 1991.
2 Michael Green. Evangelização na Igreja Primitiva. Ed. Vida Nova,
2000.
3 Preaching and Faith. UFT Publications, 1940.
4 Veja John Stott.The Living God is a Missionary God. Pasadena. William Carey Library, 1981.
5 Vicedom, George F. The Mission of God. St. Louis. Concordia, 1965.
6 Em Letters and Papers from Prison. New York. Macmillan, 1953.
3 Preaching and Faith. UFT Publications, 1940.
4 Veja John Stott.The Living God is a Missionary God. Pasadena. William Carey Library, 1981.
5 Vicedom, George F. The Mission of God. St. Louis. Concordia, 1965.
6 Em Letters and Papers from Prison. New York. Macmillan, 1953.
Este Livro me ensinou muito daquilo que vivo e prego hoje, ele é uma espécie de continuação do "Os Essenciais da Missão", que coloquei anteriormente aqui para download, além deste ainda tem outro o "Estratégias para o Plantio de igrejas", que seria a continuação deste, em breve colocarei que para que vocês tenham acesso.
Pr. Rodrygo Gonçalves
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